A Natureza é perfeita?

28 de junho de 2024 0 Por Cris Danois

Hoje me perguntaram se a natureza era perfeita e eu afirmei que sim, inclusive considerando científica e filosoficamente. Mas, decidi expandir um pouco mais para que não me acusassem de ser radical e imprópria por afirma como Kant, um imperativo categórico acerca não apenas de um objeto – Natureza, porém de um conceito – perfeição.

A questão sobre a perfeição da natureza é multifacetada e pode ser abordada sob diferentes perspectivas científicas e filosóficas. Explorando algumas delas temos, dentro de um pensar com a Filosofia, a visão teleológica. Na tradição filosófica antiga de Aristóteles, a ideia de teleologia é central. A teleologia é o estudo do propósito ou fim (Telos) das coisas. Aristóteles via a natureza como possuindo uma ordem intrínseca onde cada entidade tem um propósito final. Dentro desse esquema, a natureza pode ser vista como perfeita na medida em que cada coisa cumpre seu propósito natural.

Entretanto, se pensarmos em perfeição em termos de ordem e harmonia, como na cosmologia de Platão, a perfeição é associada à ordem e harmonia, que via o cosmos como um organismo vivo, ordenado de forma racional e perfeito. A ideia é que a natureza, em sua totalidade, forma um sistema coerente e harmonioso.

Indo para um extremo oposto, considerando a filosofia oriental, como o Taoísmo, a perfeição está ligada à mutabilidade e ao fluxo constante. A natureza é vista como perfeita exatamente por causa de sua capacidade de mudar e adaptar-se continuamente, refletindo a ideia de equilíbrio dinâmico.

Na perspectiva existencialista e pós-moderna, os filósofos existencialistas podem argumentar contra a ideia de perfeição intrínseca na natureza. Eles podem ver a natureza como um campo de contingência e acaso, sem finalidade última ou teleologia. A perfeição, então, é uma construção humana, não uma característica inerente da natureza. Aqui, de certa forma concordo, mas não como um atributo da natureza, mas como uma condição defeituosa do pensar humano – a ideia de perfeição é multifacetada e carece de precisão e de inferências suficientes.

Se considerarmos a perspectiva científica, considerando a mecânica newtoniana e o conceito de ordem no Universo, ela revela uma natureza repleta de leis físicas precisas e constantes universais, sugerindo uma forma de “perfeição” no sentido de consistência e regularidade. Por exemplo, as leis da física, como a gravidade, operam de forma previsível e ordenada.

Não obstante, a pergunta teve como ponto de observação animais e plantas. Logo, consideremos o que nos diz a teoria evolucionista e de adaptação. A biologia evolutiva descreve a natureza como um processo de adaptação e seleção natural. Embora a evolução não busque um estado de perfeição, ela resulta em organismos extremamente bem-adaptados aos seus ambientes, o que pode ser visto como uma forma de “perfeição funcional”.

Ampliando este conceito de uma biologia evolucionista, e considerando sistemas complexos e autossuficiência, eu penso que, sendo a natureza composta por sistemas complexos, interconectados e autorregulados, o que denominamos de ecossistemas, percebemos que eles mantêm um equilíbrio dinâmico e exibem uma robustez impressionante. Isso pode ser interpretado como uma forma de perfeição em termos de sustentabilidade e resiliência.

Continuando a minha reflexão não apenas sobre o objeto, mas incluindo o conceito proposto dentro do ponto de vista estético, muitos consideram as formas e padrões da natureza (como a simetria em flores, a estrutura em fractais, entre outros possíveis exemplos, como manifestação de perfeição. Essa perspectiva destaca a beleza intrínseca e a complexidade da natureza.

Por fim, posso afirmar que a natureza é ética, pois ela – a natureza – é muitas vezes neutra ou amoral. Fenômenos naturais, como desastres, não possuem uma intencionalidade moral. A perfeição, neste contexto, pode não se aplicar no sentido moral. Logo, os conceitos jornalísticos e sensacionalistas sobre a natureza ser violenta ou assassina é uma projeção humana do seu próprio agir no mundo e consigo mesmo.

A percepção da natureza como perfeita depende amplamente da perspectiva adotada. Seja no âmbito filosófico ou científico, a natureza demonstra qualidades que podem ser interpretadas como perfeição, quer seja na sua ordem intrínseca, sua capacidade de adaptação, ou sua beleza estética. Ao mesmo tempo, a noção de perfeição é complexa e pode ser vista como uma construção humana, influenciada pelas lentes culturais e epistemológicas através das quais a observamos.

Hodiernamente, como a desconstrução intelectual e lógica das novas ideologias ocidentais, o conceito de perfeição é totalmente implodido até no âmbito da Natureza pois a afirmação mais simpática a esta ideologia é que somos todos imperfeitos, gerando arte, ciência e cultura imperfeitos e, por isso mesmo, somos assim mesmo perfeitos em nossa total imperfeição.

Deixemos apenas a natureza fora dessa inflexão absurda e doentia que nos assola atualmente.